Em homenagem ao Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, o Instituto Anelo estreia seu primeiro projeto musical com foco 100% na representatividade da raça negra. Trata-se do vídeo com a regravação de Tributo a Martin Luther King, sucesso de Wilson Simonal, cuja produção envolveu apenas negros em todas as etapas de realização, do arranjo à finalização do vídeo. O lançamento será no primeiro minuto do dia 20 de novembro, simultaneamente no Facebook, no Instagram e no YouTube.
A produção, um marco na história do Instituto Anelo, conta com a participação de 21 pessoas entre professores, colaboradores, equipe técnica e um convidado especial: o percussionista Fernando Saci, músico profissional nascido e criado na periferia de Campinas que atualmente vive e trabalha em Nova York, nos Estados Unidos.
O arranjo e a direção musical são de Josimar Prince e a concepção do vídeo de Levi Macedo Lima, ambos professores do Anelo. A gravação do áudio foi feita no estúdio TS7 Produções, com exceção da participação de Fernando Saci, gravada nos EUA. O vídeo, por sua vez, tem como cenário a sede do Anelo, no Jardim Florence I.
A MÚSICA
Tributo a Martin Luther King é uma composição de Wilson Simonal (1938-2000) feita em parceria com Ronaldo Bôscoli (1928-1994). Foi gravada originalmente pelo próprio Simonal, em 28 de fevereiro de 1967, mas lançada apenas no mês de junho do mesmo ano, pela gravadora Odeon, no formato de compacto.
Isso porque a gravação ficou retida por quatro meses na censura do governo federal – na época da ditadura militar, toda a produção artística, fosse ela musical, escrita ou audiovisual, era submetida ao crivo do Serviço de Censura às Diversões Públicas (SCDP), órgão criado em 1945 e que só foi extinto com a Constituição de 1988.
Porém, em março de 1967, ao ser convidado para se apresentar na festa de entrega do Troféu Roquete Pinto, que reconhecia os melhores do ano no rádio e na televisão, Simonal, então um autêntico popstar nacional, surpreendeu ao cantar Tributo a Martin Luther King, mesmo sem a liberação da censura.
Em seu discurso, antes do número musical, ele disse:
“Essa música, eu peço permissão a vocês, porque eu dediquei ao meu filho, esperando que no futuro ele não encontre nunca aqueles problemas que eu encontrei, e tenho às vezes encontrado, apesar de me chamar Wilson Simonal de Castro.”
Essa fala entrou para a história da música brasileira. “Cinquenta e quatro anos depois, a gente ainda está aqui falando sobre racismo”, diz Luccas Soares, fundador e coordenador geral do Instituto Anelo, e que também é o principal mentor do projeto de gravação de Tributo a Martin Luther King, canção que ele descobriu ao assistir vídeos sobre a efervescência musical no Brasil da década de 1960 e que o marcou justamente pela fala de Simonal.
“Já faz tempo que tenho refletido sobre a questão racial, até porque eu sou negro e vivencio o racismo”, conta Luccas, que em 21 anos de Instituto Anelo teve – e ainda tem – de provar sua capacidade por conta da cor da pele.
“Consegui seguir adiante porque não percebia tanto (o racismo). Depois de muito tempo constatei o quanto o negro está excluído de um sistema que vem de séculos. E percebo claramente que eu não tenho mérito de nada sozinho, porque eu sei que, para eu estar aqui, muitos negros se foram, muitos negros sofreram para que eu pudesse ter o lugar de fala que tenho hoje. O mérito de um preto nunca vai ser individual.”
Luccas faz questão de dizer que o Anelo não é de direita, nem de esquerda. “A gente não entra nessas discussões. O Anelo é um projeto que respeita os valores humanos, os direitos humanos. Essa é a bandeira do Instituto Anelo, por isso essa produção nos deixa muito feliz”, afirma o coordenador, lembrando, com orgulho, que a maioria dos professores da instituição, assim como dos integrantes da Orquestra Anelo, é de pretos e pretas.
O ARRANJO
Convidado para assumir a direção musical do projeto, o cantor, compositor e instrumentista Josimar Prince, de 44 anos, nome reconhecido no cenário musical de Campinas, disse que se sentiu muito honrado e feliz em poder mostrar seu trabalho como arranjador.
“Essa música tem um sabor muito especial, é uma música de protesto e que fala da consciência negra. Então pensei em vários elementos de ritmos negros para colocar, como o ijexá, o que soou muito bem”, diz Prince, que ficou mais do que satisfeito com o resultado final.
“Pessoalmente, foi muito forte poder fazer esse arranjo pra esse dia (da Consciência Negra) e pra essa música. Quando se é jovem, a gente não tem muita noção do que é racismo. Mas, quando a gente fica mais velho, a gente percebe que tem que pensar mais sobre o assunto, porque tudo reflete o racismo”, acredita. Para ele, o racismo afeta diretamente a autoestima. “Hoje, penso que talvez teria ido mais longe na minha carreira como músico se não fosse o preconceito”, acredita.
CONVIDADO INTERNACIONAL
Fernando Saci, convidado para gravar a percussão, conta que foi um prazer participar do projeto com os músicos do Instituto Anelo, e que parou tudo para poder participar. “Essa música tem um simbolismo muito grande”, diz ele, que chama a atenção para o fato de que, mesmo fazendo parte da elite musical dos anos 1960, Simonal compôs Tributo a Martin Luther King como uma forma de autoafirmação. “É uma coisa muito louca.”
Aos 40 anos, Fernando Saci é fruto do trabalho da Casa de Cultura Tainã, espaço localizado na Vila Manoel da Nóbrega, onde começou a aprender percussão ainda na infância. Quando mudou-se com a família para Jardim Florence, conheceu Josimar Prince e outros jovens músicos e passou a atuar em grupos de samba na região.
Já como músico profissional, integrou grupos como Sacicrioulo e Black Dog Funk; ajudou a implantar o projeto Batucada 1020 ao lado do músico Ding Dong; acompanhou artistas como Leci Brandão e Reinaldo Príncipe do Pagode em apresentações na cidade; além atuar na criação de um movimento de jazz jovem na cena campineira.
Estudou no Conservatório Dramático e Musical Dr. Carlos de Campos de Tatuí e se mudou para os Estados Unidos em meados dos anos 2000, inicialmente na cidade de Boston, onde deu aulas em cursos de verão na Berklee College of Music.
Atualmente, mora em Nova York e se apresenta com regularidade em clubes de jazz, incluindo o Dizzy’s Club Coca-Cola no Lincoln Center. Entre outros projetos, faz parte do grupo que acompanha a cantora Brianna Thomas, considerada uma revelação do jazz nova-iorquino.
TALENTOS DA CASA
Levi Macedo Lima, ex-aluno que agora é professor do Instituto Anelo, assina a direção do vídeo de Tributo a Martin Luther King – além de músico, ele também dá seus primeiros passos na carreira de videomaker.
“A ideia do vídeo é mostrar um pouco do caminho que a galera percorre até chegar ao Instituto Anelo para fazer um som. Mostra também um pouco do sorriso das pessoas, além de imagens da periferia feitas com uso de drone”, conta Levi, para quem atuar num projeto como esse tem duplo significado: além de chamar a atenção para a questão do racismo, é uma forma diferente de marcar seu aniversário – ele completa 29 anos justamente no Dia da Consciência Negra.
Uma curiosidade sobre a produção de Tributo a Martin Luther King: entre os cantores está Simone Janita, de 31 anos, que é assistente administrativo/financeiro do Instituto Anelo. Ela, que desde criança canta na igreja, faz sua estreia em um projeto musical da instituição.
“O Luccas me convidou para participar do vídeo. Fiquei um pouco receosa, um pouco nervosa, porque nunca participei de gravação em estúdio, mas aceitei. Me sinto grata em fazer parte do projeto, até para conscientizar as pessoas sobre o racismo. Muita gente pensa que não, mas a gente sofre muito racismo, sempre”, diz.
O DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA
O Dia da Consciência Negra foi instituído oficialmente no Brasil em 2011, por meio da Lei 12.519. A origem da data, de acordo com o site Nova Escola, está ligada aos esforços dos movimentos sociais para evidenciar as desigualdades históricas que marcaram as populações negra e parda no país.
Ainda conforme o site Nova Escola, o dia 20 de novembro também marca a data da morte de Zumbi dos Palmares (1655-1695), um escravo que foi líder do Quilombo dos Palmares e que morreu defendendo sua comunidade. O local simbolizou a luta dos negros por seus direitos e contra a escravidão.
SERVIÇO
Estreia do vídeo Tributo a Martin Luther King Data: 20 de novembro de 2021 Horário: 0h01min. Onde: Facebook, Instagram (@institutoanelo) e YouTube
Instituto Anelo debuts first musical project 100% produced by blacks
In honor of Black Consciousness Day, celebrated on November 20, Instituto Anelo debuts its first musical project 100% focused on the representation of the black race. This is the video with the re-recording of Tribute to Martin Luther King, a success by Wilson Simonal, whose production involved only blacks in all stages of its production, from arrangement to completion of the video. The launch will be in the first minute of November 20th, simultaneously on Facebook, Instagram and YouTube.
The production, a milestone in the history of Instituto Anelo, has the participation of 21 people, including teachers, employees, technical staff and a special guest: percussionist Fernando Saci, professional musician born and raised on the outskirts of Campinas who currently lives and works in New York, United States.
The arrangement and musical direction were by Josimar Prince and the video was conceived by Levi Macedo Lima, both professors at Anelo. The audio recording was made at the TS7 Produções studio, with the exception of the participation of Fernando Saci, recorded in the USA. The video, in turn, is set at the headquarters of Anelo, in Jardim Florence I.
THE MUSIC
Tribute to Martin Luther King is a composition by Wilson Simonal (1938-2000) made in partnership with Ronaldo Bôscoli (1928-1994). It was originally recorded by Simonal himself, on February 28, 1967, but only released in the month of June of the same year, by the label Odeon, in a compact format.
This is because the recording was held for four months by the federal government's censorship - during the military dictatorship, all artistic production, whether musical, written or audiovisual, was submitted to the scrutiny of the Public Entertainment Censorship Service (SCDP), an agency created in 1945 and that was only extinguished with the Constitution of 1988.
However, in March 1967, when invited to perform at the awarding party for the Roquete Pinto Trophy, which recognized the best of the year on radio and television, Simonal, then an authentic national popstar, surprised by singing Tribute to Martin Luther King , even without the release of censorship.
In his speech, before the musical number, he said:
"This song, I ask your permission, because I dedicated it to my son, hoping that in the future he will never encounter those problems that I have encountered, and have sometimes encountered, despite my name being Wilson Simonal de Castro."
This speech entered the history of Brazilian music. “Fifty-four years later, we're still here talking about racism,” says Luccas Soares, founder and general coordinator of Instituto Anelo, who is also the main mentor of the project to record Tribute to Martin Luther King, a song he wrote. he discovered by watching videos about the musical effervescence in Brazil in the 1960s, which marked him precisely because of Simonal's speech.
“I've been thinking about the racial issue for some time now, because I'm black and I experience racism,” says Luccas, who in 21 years at Instituto Anelo had – and still has – to prove his ability because of the color of his skin.
“I managed to move on because I didn't understand that much (racism). After a long time I realized how much black people are excluded from a system that goes back centuries. And I clearly see that I have no merit in anything alone, because I know that, for me to be here, many black people have gone, many black people have suffered so that I could have the place of speech that I have today. The merit of a black will never be individual.”
Luccas makes a point of saying that Anelo is neither on the right nor on the left. "We do not enter into these discussions. Anelo is a project that respects human values, human rights. This is the banner of Instituto Anelo, and that is why this production makes us very happy”, says the coordinator, proudly remembering that most of the professors at the institution, as well as the members of Orquestra Anelo, are black and black.
THE ARRANGEMENT
Invited to assume the musical direction of the project, singer, composer and instrumentalist Josimar Prince, 44, a recognized name in the Campinas music scene, said that he felt very honored and happy to be able to show his work as an arranger.
“This song has a very special flavor, it's a protest song that speaks of black consciousness. So I thought of several elements of black rhythms to put, like the ijexá, which sounded really good”, says Prince, who was more than satisfied with the final result.
“Personally, it was very strong to be able to make this arrangement for this day (of Consciência Negra) and for this song. When you're young, we don't have much idea of what racism is. But when we get older, we realize that we have to think more about the subject, because everything reflects racism”, he believes. For him, racism directly affects self-esteem. “Today, I think that maybe I would have gone further in my career as a musician if it weren't for the prejudice”, he believes.
INTERNATIONAL GUEST
Fernando Saci, invited to record the percussion, says it was a pleasure to participate in the project with the musicians from Instituto Anelo, and that he stopped everything to participate. “This song has a lot of symbolism”, he says, who draws attention to the fact that, even though he was part of the musical elite of the 1960s, Simonal composed Tribute to Martin Luther King as a form of self-affirmation. "It's a very crazy thing."
At the age of 40, Fernando Saci is the result of the work of the Tainã Culture House, a space located in Vila Manoel da Nóbrega, where he began to learn percussion in his childhood. When he moved with his family to Jardim Florence, he met Josimar Prince and other young musicians and began performing in samba groups in the region.
As a professional musician, he joined groups such as Sacicrioulo and Black Dog Funk; helped implement the Batucada 1020 project alongside musician Ding Dong; accompanied artists such as Leci Brandão and Reinaldo Príncipe do Pagode in concerts in the city; besides acting in the creation of a youth jazz movement in the Campinas scene.
He studied at the Dr. Carlos de Campos de Campos Conservatory of Music in Tatuí and moved to the United States in the mid-2000s, initially in the city of Boston, where he taught summer courses at the Berklee College of Music.
He currently lives in New York and regularly performs at jazz clubs, including Dizzy's Club Coca-Cola at Lincoln Center. Among other projects, he is part of the group that accompanies the singer Brianna Thomas, considered a revelation of New York jazz.
HOME TALENTS
Levi Macedo Lima, a former student who is now a professor at Instituto Anelo, is the director of the video for Tribute to Martin Luther King – in addition to being a musician, he is also taking his first steps in his career as a videomaker.
“The idea of the video is to show a little of the path that the people follow until they reach Instituto Anelo to make a sound. It also shows a little of people's smiles, as well as images from the periphery made using a drone”, says Levi, for those who work in a project like this has a double meaning: in addition to drawing attention to the issue of racism, it's a different way. to mark his birthday – he turns 29 precisely on Black Consciousness Day.
A curiosity about the production of Tribute to Martin Luther King: among the singers is Simone Janita, 31, who is an administrative/financial assistant at Instituto Anelo. She, who sings in church since childhood, makes her debut in a musical project of the institution.
“Luccas invited me to participate in the video. I was a little afraid, a little nervous, because I've never been in studio recording, but I accepted. I am grateful to be part of the project, even to make people aware of racism. A lot of people think not, but we suffer a lot of racism, always”, she says.
THE DAY OF BLACK AWARENESS
The Black Awareness Day was officially instituted in Brazil in 2011, through Law 12,519. The origin of the date, according to the Nova Escola website, is linked to the efforts of social movements to highlight the historical inequalities that marked the black and brown populations in the country.
Also according to the Nova Escola website, November 20th also marks the date of the death of Zumbi dos Palmares (1655-1695), a slave who was the leader of Quilombo dos Palmares and who died defending his community. The place symbolized the struggle of blacks for their rights and against slavery.
SERVICE
Premiere of the video Tribute to Martin Luther King
Date: November 20, 2021
Time: 12:01 am
Where: Facebook, Instagram (@institutoanelo) and YouTube
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